Fim da Classe Média Brasileira?

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Os solavancos da economia têm provocado efeitos negativos na distribuição de renda nacional. O executivo Marcos Freitas analisa os possíveis resultados e motivos para o cenário (Crédito da imagem: Freepik)

Por Marcos Freitas Pereira

Nos últimos dias fomos surpreendidos com as notícias econômicas dos dois maiores países do mundo, China e Estados Unidos. A China cresceu no 1º. trimestre de 2021, comparando com o mesmo período de 2020, período que foi paralisado em função da pandemia, 18,3%, para o ano, o crescimento previsto é de 6%, previsão interna e de 8,4%, previsão do FMI. Enquanto isso, os Estados Unidos da América anunciaram previsão de crescimento de 6,4% até 8,1%, portanto, depois de muitos anos os Estados Unidos poderão crescer mais do que a China.

Os dois países terão em 2021 o crescimento em forma de v, ou seja, em apenas um ano voltarão aos níveis de pré-pandemia.

No Brasil a situação não é nada animadora, há uma previsão de queda no PIB no 1º. trimestre de 2021 de 0,5%, IPEA e de um crescimento de 3,08% no ano de 2021 e de 2,4% em 2022, Relatório Focus. Portanto, enquanto Estados Unidos e China retornarão aos níveis pré-pandemia nesse ano, 2021, o Brasil, se tudo ocorrer de acordo com as previsões que estão se reduzindo a cada semana, o período pré-pandemia só será alcançada após 2 anos.

A diferença básica dos Estados Unidos e China com o Brasil, é de que os primeiros trataram a pandemia com competência, tomando ações recomendadas pela ciência e não tiveram medo de intervir na economia para reduzir os impactos do Covid-19. Agora sabemos quem agiu certo.

 Após o contexto acima, o principal ponto desse artigo é que esse cenário está trazendo de volta a sombria redução da classe média brasileira.

Quadro 1 – Evolução da participação de grupos de classes econômicas

2003200920112013
AB7,6%10,6%11,7%14,8%
C37,6%50,5%55,2%60,2%
DE54,8%38,9%33,1%25,0%
100,0%100,0%100,0%100,0%
Fonte: Fundação Getúlio Vargas e Marcelo Neri

Pelo quadro 1, acima, constata-se que no período de 2003 a 2013 a classe média, classe C, ganhou 22,6 pontos percentuais de participação no total da população, enquanto as classes baixas, classes DE, reduziram 29,8 pontos percentuais e se pode observar também um crescimento na classe alta de 7,2 pontos percentuais, ou seja, houve uma transferência de pessoas da classe média para a classe alta e uma transferência maior ainda da classe baixa para a classe média. Cada ponto percentual representa 2 milhões de pessoas. Portanto, nesse período, 48 milhões de pessoas ingressaram na classe média e essa passou a ser a classe mais populosa do Brasil.

De acordo com matéria publicada na folha de São Paulo de 17 de abril de 2021, 80% das famílias de classe média tiveram alguma queda na renda. Oito em cada dez famílias em que o rendimento mensal com o trabalho fica acima de 5 salários mínimos perderam entre 20% a 50% da renda quando comparado o 4º. trimestre de 2020 com o mesmo período de 2019, sendo que 7% dessas famílias perderam todo o rendimento.

Diz ainda a reportagem que, nos últimos meses, a classe média teve de trocar os filhos de escola e rever despesas de consumo para reorganizar o seu orçamento. O cenário preocupa a classe média, porém, a classe mais baixa que ganha até 1 salário mínimo também está em situação frágil. Entre as famílias que ganham até 1 salário mínimo e perderam renda, 60% perderam 100% da renda.

O quadro abaixo demonstra uma estratificação mais detalhadas das famílias brasileiras.

Quadro 2 – Mudança de estratificação familiar entre 2002 e 2015

 200220112012201320142015
Alta Classe Média7,0%7,9%8,9%8,5%9,1%8,5%
Média Classe Média11,0%14,0%15,6%14,3%14,8%14,4%
Baixa Classe Média29,2%42,0%43,0%44,3%46,2%44,4%
Massa Trabalhadora28,6%27,7%25,1%24,8%23,2%25,2%
Miseráveis24,2%8,3%7,4%8,1%6,7%7,5%
 100,0%99,9%100,0%100,0%100,0%100,0%
Fonte: Waldir Quadros

O quadro de Waldir Quadros demonstra a classificação mais detalhada do que o quadro anterior, dando destaque à evolução da classe de miseráveis.

Com os efeitos que a classe média está sofrendo nesse momento, os quadros acima poderão ter outra foto nos próximos anos. Deverá haver uma transferência significativa da classe média para as classes baixas e haverá um aumento significativo da classe de miseráveis, que havia reduzido 16,7 pontos percentuais no período 2002 a 2015. Não se pode calcular em que ponto anterior dessa evolução a classe média poderá recuar, com certeza haverá esse recuo, ou seja, as próximas estatísticas, indubitavelmente, nos trarão uma reversão desse processo benéfico ocorrido nos 13 anos (2002-2015).

É lógico que os efeitos da pandemia têm agravado a situação, porém, é importante enfatizar que o modelo econômico neoliberal adotado a partir de 2015, ainda no governo Dilma e continuado nos governos Temer e no atual, tem também contribuído muito para a piora da situação da classe trabalhadora, maior desemprego, perda real de salários e perda real do salário mínimo.

Por fim, extrapolando a situação econômica para a situação política brasileira, essa classe média que cresceu em número no período do governo do PT, como demonstram os dois quadros acima, foi a principal incentivadora para o fim do governo.

Ela queria muito mais. Sociologicamente, após ascender, essa nova classe média buscava se equiparar a classe média tradicional, a partir daí não foi mais o confronto capital x trabalho, o confronto empresário x trabalhador e sim o confronto Estado x Sociedade. Essa nova classe média passa a repudiar as ações do Governo na economia e tenta se associar à classe média tradicional, que historicamente sempre foi liberal para os outros e intervencionista para ela, o governo a sua disposição.

Para o cenário do próximo ano, de redução da classe média e de aumento das classes baixas, inclusive a classe de miseráveis, os anseios do início dos anos 2000 estarão de volta: a defesa de uma maior participação do Estado na economia para garantir emprego, crescimento econômico e políticas salariais com ganhos reais estarão na pauta das principais reinvindicações. Já se pode perceber essa mudança no momento atual, através das pesquisas de tendências eleitorais para 2022 depois que o ex-presidente Lula voltou à cena política.

A troca do atual governo e da atual política econômica serão inevitáveis nesse cenário econômico e político que vivemos.

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Natural de São Paulo, Marcos Freitas Pereira acumula mais de 25 anos de experiência de mercado. Doze destes anos foram como administrador em cargos de comando na Pousada do Rio Quente Resorts.

Exerceu as funções de Gerente de Orçamento e Finanças, Controller, Diretor Estatutário Administrativo Financeiro e Diretor de Relações com o Mercado. Além disso, dois anos como Diretor Superintendente, principal executivo da empresa. Atualmente atua como Sócio da WAM Brasil.

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