Algumas observações sobre o DIP Financing na Recuperação Judicial

Renaldo Limiro

Advogado especializado em Direito Empresarial, com foco em Recuperação Judicial; autor de vários livros jurídicos; MBAs e pós-graduações por FGV, UFG e PUC-GO; articulista de vários veículos, conferencista e palestrante.
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(Crédito da imagem: Pixabay)

A Lei de Falências e Recuperação de Empresas, de número 11.101/05, sofreu diversas alterações no final do ano passado pela Lei 14.112/2020, sendo uma delas a possibilidade de concessão de financiamento ao empresário que se encontra em processo de recuperação judicial, mais conhecido como DIP financing, de origem no direito norte-americano.

Ocorre que, quando protocolado o pedido de recuperação judicial, e como o mesmo não corre em segredo de justiça, ele se torna público e a consequência primeira é o fechamento de todo e qualquer tipo de crédito ao recuperando. E quando isso ocorre, normalmente, o beneficiário do instituto da RJ encontra-se sem caixa para até mesmo continuar tocando sua atividade.

Os exemplos colhidos ao longo dos quinze anos de vigência dos dispositivos originais da Lei 11.101/05 trouxeram ao legislador, através dos doutrinadores e jurisconsultos, o reconhecimento da necessidade de se criar algum meio que possibilitasse ao recuperando e ao seu financiador termos que dessem ao primeiro as condições de continuidade de sua atividade e, ao segundo, mesmo com a falência deste, a garantia de poder ter de volta o seu investimento.

Assim, e com base na experiência do direito norte-americano, a Lei reformadora de número 14.112/2020, criou, em seu Artigo 69-A e seguintes, o DIP Financing (debtor-in-possession), sob esta redação:

“Art. 69-A. Durante a recuperação judicial, nos termos dos arts. 66 e 67 desta Lei, o juiz poderá, depois de ouvido o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos”.

Vê-se, pela redação do acima transcrito artigo 69-A, a necessidade da oitiva do Comitê de Credores (obviamente, se ele existir) e sua aquiescência, bem como a faculdade de o juiz do feito autorizar ao devedor a contratação do citado financiamento (art. 66). Em que condições? As mais rígidas possíveis e favoráveis ao investidor, como a oneração ou a alienação fiduciária de bens e direitos. Se estes bens forem da recuperanda, terão que pertencer ao seu ativo não circulante. Estes bens e direitos garantidores do questionado financiamento poderão também ser de terceiros.

Muito interessante também nesta espécie de financiamento é o dispositivo que diz que o juiz poderá autorizar a constituição de garantia subordinada sobre um ou mais ativos do devedor em favor do financiador, dispensando a anuência do detentor da garantia original. Porém, a este sempre será assegurado o valor da respectiva garantia, ficando com o investidor (o novo financiador do recuperando) somente o eventual excesso da venda do ativo objeto da garantia. Por outro lado, esta garantia subordinada, absolutamente, não tem aplicabilidade sobre as modalidades de cessão fiduciária e alienação fiduciária.

Passados estes percalços e alguns outros mais desta nova modalidade de financiamento, diz a Lei que este poderá ser realizado por qualquer pessoa, inclusive credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, familiares, sócios e integrantes do grupo do devedor, assim como qualquer pessoa ou entidade poderá garanti-lo, permitindo-se aqui a oneração ou alienação fiduciária de bens e direitos, inclusive o próprio devedor e os demais integrantes do seu grupo, estejam ou não em recuperação judicial.

É óbvio que para o devedor/recuperando é uma nova saída, ou seja, uma oportunidade de dar continuidade à sua atividade; também, por outro lado, e à exceção do contrato efetuado sobre a garantia subordinada (cujo valor cubra somente o primeiro contrato ou pouco mais). É para o novo financiador melhor ainda, pois a Lei lhe assegura o retorno certo do seu investimento, mesmo na hipótese de o financiado vir a ter a sua recuperação judicial convolada em falência ou esta decretada por outras razões, dada a extraconcursalidade de seu financiamento (Art. 84, I-B, da Lei 11.101/05).

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